do neo-canibalismo ao tretoterismo, o caótico corpus do movimento homeostético, suas tricas, sequelas, etc.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

C. & E. (casa)


No passo seguinte Alice estava no outro lado do espelho e, dando um pequeno salto, desceu para a Casa-Espelho. (L. Carrol)




Ir ao outro lado do espelho é mais que uma simetria, ou técné – é passar da dimensão aparente do corpo à sua essência, é ser conduzido ao interior onde toda a lógica se desfaz ante o entrevisto que se torna evidente.

Paródia significa união de posições opostas inconciliáveis. A discords concordia é a forma de estruturar e formalizar tal situação. Paródia significa não só que se nega o que já se havia afirmado, mas que o principio de verdade tem duas faces, e a realidade dois extractos. Se se quizer ser vero e fiel à realidade há que evitar a todo o custo a simplificação e apreender as coisas na sua complexidade.

«O pensamento está intimamente misturado com a descrição: se pinto orelhas penso no ruído, se pinto lábios penso na palavra, pintando os dentes penso nos alimentos.» (Picasso)


Achas que gostarias de viver
na Casa-Espelho, Kitty?
(L. Carrol)

Uma casa feita com ramos de pinheiro?
O olho com sobrancelha
.
(enigma azeteca)




Casa-Espelho – o interior como espelho do exterior. O saber aceitar plenamente os objectos. Todos os objectos são iguais, irmãos. Fim das tiranias do Ego. Livre circulação interior/exterior.

Qual o estado juridico de tal situação transfronteiriça? Contrabando? Ou supressão do sistema alfandegário?

Que os objectos não sejam afins de juízos. Apenas valerá o silêncio como legitimização das incertezas ou como critica de uma incerteza e os correspondentes cepticismos.

A eticidade aceitável é a da elucidação dos laços e da sua activação através vivência erótica dos nucleos conceptuais das incertezas.

«A mentira que diz a verdade» ilustra bem este tipo de nexos e de frontalidade. Contra a ética que não sabe senão julgar, há a ética da produtividade, a ética como actividade po-ética.



Casa-Espelho: espaço de indeterminações, de flutuações. Concavo-cônvexo. Labirinto. Mundo dos Possiveis. Possibilidade de vários mundos como em Giordano Bruno.

Casa-Espelho: olhamos com o nosso olhar virado-para-o-exterior: dizemos fronteira. A epiderme do Outro, do Duplo, avança.

Os 3 duplos do representador:

1. a sombra
2. o mundo
3. a obra

Memória. Consciência. Possibilidade.

Fenomenologia do alfandegário – adivinhar os Duplos.

Tirésias não Vê porque transcendeu o dominio do visível, o dominio do olho, do Ego, da identidade.

Tirésias é o antecessor do seu antepassado mítico Homero.

Tirésias vê o passado/presente/futuro. Homero só consegue olhar para o passado – unifica-o e dá-lhe sentido. Ao reencontrar esse passado faz-nos cada vez mais antigos.

Fronteira – consciência do finito. Onde o tacto toca. Saber encontrar o fim. Nitidez.

A dissolução do tacto no tocado e do tocado no tacto: o íntimo tocado.

Encontrar o fim desde o princípio – desestudar, desaprender. Estas são as permissas duma arte que tem como percusoras as «antropofagias» do Herberto Helder:

«Agora ocupamo-nos nos apocalipses, e principia a perversa alegria de escrever mal, o gosto de coçar (...). Não é bem saír do silêncio, encontrar-se a «escrever», não é bem o desejo de mau gosto e desorganização. Será já um pouco «outro lado»?Também não se vai tornar «novo», evidentemente. Mas, de qualq uer modo fez-se um percurso que cabia fazer. Chama-se apenas a atenção para uma certa festividade destrutiva. Abunda em tudo isso alguma alegria antropofágica.»



E depois está tão explícito esse «outro lado» impossível e inimaginável - a autoridade canibalistica de atravessar espelhos, do desfazer festivamente, do afastar o luto, o «nojo», a repugnância pelo já instituído: rito de passagem ou sucessão de ritos de passagem.

A Morte Imaginada do Pai-Analítico.

A perplexidade é sempre a mesma – das auto implicações-afirmações-negações da(s) teologia(s) negativa(s) aos pontos cruciais das ciências analíticas (cosmologias negativas?).

Dilaceração do Negativo : ser o ser-e-não-ser.

Representação que para ser se representa e não representa – o teatro bruto-sagrado de Peter Brook com a presença do visivel/invisivel. Teatro para todos, para as massas. Teatro da consciencia a trabalhar com a inconsciencia.

Atravessamos as Casas-Espelho e começamos a desaparecer, a comermo-nos uns aos outros.

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