do neo-canibalismo ao tretoterismo, o caótico corpus do movimento homeostético, suas tricas, sequelas, etc.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

KNOSSOS


Knossos é uma «história» de M. Vieira, modelo crú, romantico, desconcertante da prosa romanesca homeostética.



I

Onde o autor fala do sistema político de Knossos

“Toma, minha grande vaca, toma! Toma!!” – Kassanor, último rei de Knossos, resfolega, sua, chicoteia a pobre rapariga nua, possesso por uma onda de luxúria cega. Dois dos seus sequazes utilizam tenazes, vibradores, alicates, rodas de oleiro, serrotes, alfinetes, tudo o que há à mão.
O rei grita de alegria sádica. Três vultos, na mesma sala, assistem a tudo. O palácio de cores quentes cai aos bocados, corpos nus e sujos de vinho, comida e sexo espalham-se pelas suas salas imóveis, ressacando. Só a grande sala está agitada…
Hoje é o último dia da semana de debocheorgiasbacanais, na qual tudo é permitido ao rei. Hoje, ele tem que aproveitar ao máximo, pois é o último dia do seu reinado. O céu vermelho parece devorar a cidade e corvos vão e vêm sem cessar. A multidão agitada aguarda fora do palácio, enquanto algumas raparigas virgens são sacrificadas ao deus baal (verificar grafia; maiúscula?), formando fogueiras por toda a cidade. Algumas pessoas morrem sufocadas pelo fumo. A frota aqueia está próxima. (os aqueus, bárbaros vindos do Norte pretendem invadir a decadente e corrupta cidade de Knossos.)

O rei continua a resfolegar. Os seus olhos brilham como berlindes. Enfiou a sua picha no cu quente de Gabriela e atinge o clímax. Os seus movimentos são brutais e Gabriela, que sangra por todo o lado, solta gritos de dor. Quando o rei, por estes excitado, atinge o orgasmo, o sumo-sacerdote sai da escuridão e estrangula-o com o garrote.
A tempestade acalma de repente…
Os sacerdotes abandonam o corpo do rei aos corvos, que, depois de o devorarem em segundos, deixam a cidade.
Os sacerdotes saem do palácio. “O rei morreu, dizem ao povo”.

Ah! O sol nasce das nuvens!
Uma chuva de flores cai sobre a cidade. Por toda a parte se? dança alegremente. As mulheres jovens enganam os seus maridos velhos e prestam-se festas em honra da vida, da juventude, da primavera, da beleza. Grupos cantantes passeiam pela cidade regenerada, ao som de liras e flautas. O povo traz o seu novo rei pelas mãos. É jovem e belo. Governará mais quatro anos, por mais um ciclo.

Fim da primeira parte *

* Este documento foi-nos gentilmente cedido pelo museu da Acrópole de Atenas e foi escrito pelo poeta do séc. (?) KANNADASSUKAK, O DEMENTE, em “A política na nossa era”.



II

Diálogo sobre o poder

Gabriela sentara-se debaixo de uma oliveira nos campos perto da cidade. O céu estava azul e o sol banhava-lhe o rosto. Repousava. O cantar dos pássaros ecoava pela tarde e o cheiro da terra e das ervas misturava-se com o do seu sexo, quando, de longe, surgiu uma bela vaca, na idade madura. Meteu conversa.
Arf! Arf!
Céus! – disse Gabriela. Uma vaca a ladrar?
É verdade. – disse a vaca. Mas posso fazer muito mais. Ainda não viste nada.
Gabriela estava irritada. De repente, tinha-se apercebido de que tinha uma vontade enorme de fazer amor. Mas nunca com uma vaca. Que veio fazer aqui uma vaca?
A vaca falava.
História da vaca:

“Sobre estes campos que vê agora, viveram outrora muitas vacas bonitas como eu. O verde da erva fazia parte da nossa vida e vivíamos despreocupadas, ruminando calmamente. A erva nunca parava de crescer, pois as nossa fezes estrumavam a terra e dela saía muita erva, verde, cheia de proteínas. Um dia, chegaram os cães, vindos da distante Ásia Menor. Aqui, na nossa ilha, plantaram um império. Eram uma raça de guerreiros e comerciantes selvagens. Aproveitando-se da nossa inofensividade, provocada pela nossa vida sem problemas, abusaram de nós, dizimando-nos aos milhares para nos comer, destruindo todo o nosso lírico universo.
Mas algumas das minhas irmãs organizaram-se (clandestinamente, pois na época eram proibidas reuniões de mais de duas vacas) e formaram um exército. Por fim, e, como dizem os americanos, “to make a long story short”, o nosso exército defrontou o dos canídeos na célebre batalha de Manabara. Foi um massacre. Todos os cães morreram e das vacas só restou a minha família, da qual sou a última sobrevivente. Não tenho descendência”.

Gabriela estava aflita. Tinha cada vez mais vontade de fazer amor e não sabia como se livrar da vaca. Queria pelo menos masturbar-se, estava muito húmida, mas como, com aquele bovídeo presente?
“Nada a fazer”, pensava Gabriela, quando, de repente a vaca foi trespassada por uma lança. Diante dela estava uma horda de guerreiros aqueus, que iam conquistar a cidade.
Que sorte! , exclamou a Gabriela. Vêm em muito boa altura .

Fim do II capítulo

Ainda hoje na Liga Aqueia os velhotes contam como a invasão aqueia foi detida por uma só mulher. Consta que nem os 300 guerreiros aqueus foram capazes de satisfazer Gabriela, que correu atrás deles reclamando um pouco mais de calor humano. Os aqueus correram precipitadamente para os seus navios. Os que caíam eram pisados. A confusão foi tal que, à saída da baía, os barcos chocaram, afundando-se, e os aqueus, não querendo voltar a Creta a nado com receio de que Gabriela os esperasse, nadaram em direcção ao seu país, afundando-se todos pelo caminho.

Menos um: Arménio.
Arménio foi parar a uma ilha.

Ali está sob a sombra de uma palmeira.

“Porque fui poupado? Porque não tive a mesma sorte dos meus irmãos? Mas bolas para isso! É primavera. É primaveraaaa!” – gritou agitando os braços. “Estou cheio de amor e tudo é harmonia.”
Saltando e correndo, Arménio foi-se perdendo nos labirintos da floresta. Tropeçou e caiu, perdendo a consciência.
Quando a recobrou, tudo estava azul e sentiu uma sensação de movimento. Abriu uma janela e viu que estava a ser transportado numa liteira por dois hámsteres vestidos de bispos, correndo velozmente pela estrada de tijolos amarelos. Passaram por uma ponte romana, por uma paisagem de esparguete, depois de uma paisagem de maminhas, uma de moedas verdes enormes, uma de autocarros da Carris suspensos no ar, uma de enormes plantas carnívoras, que quase os iam devorando, até que pararam no alto de uma colina, onde havia um castelo enorme em forma de moinho de pimenta. Entrou por uma grande porta e passou por um corredor ladeado por grandes guardas da Carris com cabeças de vacas azuis. No fim de tudo estava o trono do mandarim, um coelho velho e chato, com um olhar muito melancólico e com chifres de vários animais formando uma densa confusão sobre a sua cabeça.
Como todos os mandarins, tinha compridos bigodes pretos que chegavam ao chão. À sua volta, castores agitavam as caudas para que a névoa púrpura que saía constantemente das narinas do mandarim se dissipasse, e bailarinas dançavam nuas sobre pedaços de vidro.
Arménio estava perplexo.
“Que querem de mim?”, disse ele.
O coelho bateu as palmas da mão e toda a gente desapareceu.
Depois falou assim:
“Tenho um grande problema. Se me ajudares, farei de ti um homem rico.”
“Que problema?, disse Arménio com inocência.
“A minha mulher encorna-me”, disse o mandarim.
“Mas como posso eu ajudar-te?”
“Só tu, um estrangeiro, me podes ajudar. Agora ouve bem: a minha mulher está lá em cima” – e apontou para a densa massa de cornos sobre a sua cabeça –, “chegada a noite trepas pelos meus cornos. Depois penetras no seu quarto e vês com quem ela dorme. Depois vens, e avisas-me.”



Chegada a noite, e depois de um bom banquete, Arménio subiu pelos cornos do rei acima. Depressa percebeu que eles formavam uma floresta. De cada árvore da floresta brotava o sexo de um animal.
Chegou a uma clareira com uma casinha de madeira no meio, a porta estava aberta e ninguém em casa. Viu que a casa era composta unicamente por um quarto, no qual uma grande cama, cheia de almofadas, cetins de todas as cores, ligas, cuecas e meias de mulher, ocupava a maior parte. A parede era encarnada e tinha nus do século XVIII na parede. Havia também uma janela.
De repente, Arménio ouviu um ruído e escondeu-se debaixo da cama. Aproximava-se uma mulher muito bem feita e bela, como todas as mulheres destas histórias de cornudos. Seguia-a um esquilo.
Debaixo da cama, Arménio sentia-se muito mal. Viu o esquilo ir embora depois de saciado. A seguir veio o peru, depois deste saciado, um cavalo. E por aí adiante.
Toda a noite se sucederam estas visitas animalescas. Por fim, a mulher infiel disse: “Bom, parece que por hoje acabou.”
A partir daí começou a dormir.
Arménio sentiu-se invadido por um grande tesão. Pouco a pouco, foi fazendo um buraco na cama. Depois, foi começando a sentir as carnes tenras da devassa. Lentamente, penetrou dentro da sua rata.
“Ah!” – pensou Arménio – “A maldita nem notou!” Começou a fazer os movimentos com maior vigor. Como esta não notasse, enfiou lá a perna. Depois o braço e por aí adiante.
Arménio descobriu então que o maior problema do rei era não poder trepar pelos seus próprios cornos.
Então, enquanto a mulher dormia, meteu as pernas de fora e começou a caminhar.
Passou pela floresta e desceu os cornos até ao rei.
O rei, ao ver a sua mulher caída do céu, exclamou: “Desmodina! Meu amor! Voltaste!”.
A mulher não compreendeu como ali tinha ido parar. Então, Arménio saiu de dentro da ciclópica vulva, envolvida em molho.
O rei, ao ver tal coisa exclamou:
“Que é isto?”.
A mulher, atónita, não compreendia.
Arménio, sentindo-se em perigo, disse: “PAPÁ! MAMÃ!”.
O rei soltou então um sorriso:
“Um filho! É o meu filho! O nosso filho! E que bonito que ele é! Mas… espera… é igualzinho ao homem que mandei espiar-te! Até ele tu seduziste! MALDITA!”
O mandarim sentiu o desgosto invadir-lhe o coração.
Cambaleando, com os olhos muito abertos, avançou pelo corredor.
Desceu escadas. Tropeçava mas levantava-se outra vez, cego na sua dor, só pensava em vingar-se do universo. Sim! Não foi só culpa da mulher! Todo o universo o atraiçoou! Errou por corredores e catacumbas só por ele conhecidos até chegar a uma sala repleta de computadores, botões e luzes de várias cores que acendem e apagam. No meio da sala estava uma alavanca, o coelho agarrou na alavanca e a suar, disse:
“Vou desencadear uma grande explosão!”.
No instante em que ele ia fazer isso ocorreu um milagre, atribuído hoje a Santa Eulália ou a Santo António de Pádua, que consistiu num grande nevão que caiu sobre o castelo de pimenta ficando este soterrado e destruindo todos os seus habitantes. Foi mesmo uma sorte.

Fim do II capítulo



Entretanto, numa longínqua aldeia do Nepal, três raparigas dançam danças indígenas. Um sujeito de calças gordas fotografa.
Fotografar, fotografar sempre. Registar a todo o momento. O olho da máquina não se cansa. Fotografar. Fotografar para esquecer que a Aninhas o trocou por um bom pianista de jazz. Fotografava freneticamente quando surgiram 2 grandes cavaleiros mongóis.
Foi violentado e humilhado, além de espancado. Como tinha ele ido parar àquele canto obscuro do planeta? Esquecer, esquecer a Aninhas… Meu Deus… Com um pianista de jazz… porque não com um tocador de batuque africano num ambiente de castanhos-escuros ao som ritmado do sexo sexo… a Aninhas…
Delirava assim disparatadamente quando reparou que não via de um olho. Era de noite e estranhos seres começaram a surgir da escuridão. Ele estava dorido, cego de um olho e totalmente inseguro.
Não tinha a sua máquina. Tinham roubado a sua máquina!
Apareceu uma fada montada em cima de um vendedor de apólices de seguros relinchante. Montou também com ela. O vendedor galopava a toda a velocidade. A fada falava.
“Sibili Sibilim, há três anos que galopo e ainda não vi ninguém como tu. Como te chamas?”
“Gaspar. Gaspar Ledeboche e tu és uma fada linda sibili sibilum, sim, és linda e estou-me nas tintas para a Aninhas mais o seu tocador de piano, e para o mundo dito normal e amo-te e galopo a toda a velocidade e o vento bate-me na cara, respiro o ar frio e húmido e puro da floresta às 6 da manhã, as folhas batem-me na cara, as minhas mãos acariciam os teus seios, deixemos este infeliz, não temos o direito de montar em ninguém, mesmo num vendedor de apólices de seguros, quem sabe se um dia ele não se tornará uma borboleta, como nós, tantos pássaros, uma flauta de madeira que ecoa pelos bosques, que respira, que é um pulmão generoso.
Como sabe bem beber tudo isto… sim, sim sibilim sibilum, aconcheguemo-nos, é de manhã e está frio, os teus cabelos claros no meu peito sibilum dundadarum
Viva o júbilo que provém do conhecimento da natureza que habita em nós.”
O sol está mais quente agora. Gaspar e a fada avançam em direcção ao horizonte, no qual está uma estalagem.
Dois homens comem de olhos esbugalhados trocam-se olhares vorazes e devoradores. Tudo é devorado, os bocados de comida que caem pelos cantos da boca logo são apanhados, num frenesim de egoísmo armazenamental. Come, come. Leva a mão à boca, cava a comida como areia, o teu cérebro fica areia.



INTERMÉDIO EXPLICATIVO
Tudo isto não passou de um pequeno desvio. Mas voltemos a Creta e à nossa heroína Gabriela.

CAPÍTULO IV

Na estação de serviço Mobil, três guardas da Polícia Militar passeiam pelo jardim que está perto, com um ar sério. Surgem das árvores orangotangos que lhes atiram com carris de metro. Um velhote atira milho a pombos com capacete nazi. No lago, a proa de um Boeing 477 emerge, dando abrigo aos cisnes.
O guarda da estação de serviço já não possui gasolina há muito tempo, criou raízes na terra, saem-lhe arbustos das costas e folhas do nariz. É verde.
Os caixotes de lixo municipais soltaram-se dos postes e tentam abocanhar os transeuntes incautos. É tarde. Está muito calor, só se está bem no jardim, à sombra de um carvalho centenário”, pensa Gabriela. Knossos brilha ao sol.
Enquanto uns fazem a sesta, outros filosofam:
– “És um velho imbecil, Heraklion! És um recalcado, um egomaníaco depressivo, a tua sisudez é feita de sacrifícios estéreis, és estéril, chato, saem-te arbustos das costas, e folhas do nariz. Além disso, és verde. Estás cada vez mais vegetal e as tuas teorias criam caruncho. Hão-de apodrecer ao sol brilhante de uma nova era em que as borboletas voem sem cinto de segurança.”
– “Podes falar, eucalipto, mas não podes negar que a tua aparente volúpia é feita de tijolos de concreto. És desleal, pois eu fui o teu mestre e um bom pupilo, não se revolta contra o seu professor. Sou bem mais douto do que tu. Rio-me das tuas transmutações alquímicas, que só consegues excitar as mentes de uns escassos mentecaptos de luxo, que não tiveram suficiente carinho na infância. É verdade que sou verde mas tu és castanho e, como eu, estás pegado ao chão por bifurcadas raízes. Do teu cabelo, que parece um emaranhado de lentilhas, surgem setas de várias cores, mas cada um aponta para um lado. És feio, Eucalipto.”
Nisto surge Gabriela. Ouvindo a discussão começa a despir-se.
– “Que é isto?!” – dizem os filósofos em uníssono.
Gabriela brinca com os seus opulentos seios e exibe escandalosamente o seu entre as pernas.
– “Raios!” – diz Heraklion– “Tenho de fazer qualquer coisa!”
– “Mas o quê?” – diz Eucalipto – “Estamos presos pelas raízes da nossa própria sabedoria.”
– “Porque é uma sabedoria cretina.” – diz Gabriela – “Apesar de todo o vosso saber, não podem sair daí e vir cumprir o vosso papel natural.”
– “Bolas, Heraklion! Arranquemos estas raízes que nos prendem!”
– “Impossível, meu colega. Estamos deveras presos.”
O coro: – “Amo esta mulher. O seu corpo de curvas subtis esvoaça com leveza e o seu cabelo tem ondas como o mar. Navego. Navego no seu olhar de uma luz infinita e sinto cada vez mais perto a eclosão do caos. As suas apetecíveis coxas brilham ao sol e reflectem o meu rosto deleitado de tanto respirar e cheirar essa mulher.
Sereno, defronto o perigo de cair da minha linha de equilibrista brista Brígida era uma bela moça do campo Brígida, naquele dia apanhei-te pela frente as saias caíram na estrumaria eu vi os teus seios e vi a diferença.
Oremos a Zeus: Ó Zeus! Ave Zeus cheio de subtileza, cantado seja o vosso nome, bem considerada seja hoje como amanhã, como na terra nos deu ontem naveguemos serenos.
Eucaliptdonisilastrophagya.

Mas deixemos KNOSSOS por 1 momento e vejamos:





IVVIIIXX capítulo

Arménio sai debaixo dos escombros e canta uma melodia céltica quando sente que os seus pés não estão assentes em terra.
Voa por arco-íris de subtis variações. Um tapir abre a janela de uma nuvem e deita fora o lixo da casa. Arménio pensa em como gosta de manteiga de amendoim e de tudo o que é verde-alaranjado e em como a vida pode ser divertida se conseguirmos tocar num ser contrário e sentir ecoar em nós um encadeamento de processos que nos põem a voar.

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